sexta-feira, 11 de agosto de 2017

A vertigem da interrogação

" Não deixa de ser devastadoramente  verdadeiro que o pensamento, seja qual for  o seu estatuto, a sua concentração, o seu salto sobre fendas do desconhecido; seja qual for  o seu génio de comunicação e de representação simbólica, não fica mais próximo de apreender os seus objectos primeiros. Não estamos  um centímetro mais próximos do que Parménides ou Platão estavam de alcançar alguma solução verificável para o enigma da natureza ou do propósito , se é que este existe, da nossa existência neste universo provavelmente múltiplo; da identificação da finalidade , ou não, da morte e da possível presença ou ausência de Deus. Nós podemos até estar mais longe de a alcançar. As tentativas para " pensar ", para "pensar aturadamente" sobre estas questões, rumo a algum santuário de resolução justificativa, ou explicativa, produziram a nossa história religiosa. , filosófica, literária, artística e, em larga medida , científica.  Este empreendimento mobilizou os intelectos mais poderosos e as sensibilidades mais criativas  da raça humana : um Platão,  um Santo Agostinho, um Dante, um Espinosa, um Galileu, um Marx , um Nietzsche ou um Freud.  Ele criou  sistemas metafísicos  e teológicos tão fascinantes pela sua  subtileza  como sugestivos  pelas suas propostas. Antes  da modernidade , as nossas  doutrinas , a poesia , a arte,  e a ciência  eram sustidas  pelo  questionamento urgente  da existência , da mortalidade  e do divino. Abstermo-nos deste questionamento, censurá-lo, seria anular o pulsar e a dignitas que definem a nossa humanidade. É a vertigem da interrogação que activa uma vida examinada. "
George Steiner, in Dez Razões (Possíveis) para a Tristeza do Pensamento, Relógio D'Água Editores, Novembro de 2015, pp. 66,67

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